- O que hoje conhecemos como festa junina tem origem nas celebrações dos povos agrários existentes antes da criação da Igreja Católica. Essas comemorações estavam ligadas aos fenômenos da natureza, como o solistício de verão, por exemplo, quando se comemorava a colheita na Europa. Era uma forma de agradecer o calor, a vida. A fogueira vem daí, como símbolo do calor, de vida. Quando a Igreja Católica surge e começa a organizar seu calendário, ela reapropria e resignifica algumas festas já existentes e passa a comemorar os santos Antonio, João e Pedro no mês de junho, aproveitando a idéia do sol que ilumina, que purifica. O elemento principal dessas celebrações é o fogo. O foguete e o balão surgem daí – detalha a pesquisadora e professora da UFRJ Cáscia Frade.
Entendido até aqui, mas então como estas festas chegaram ao Brasil e qual a razão das roupas remendadas, das bandeirinhas e do forró? Segundo a professora, as comemorações juninas vieram no processo da catequese trazido pelos jesuítas.
- Depois dos jesuítas, a vinda da missão cultural de Dom João VI contribuiu para incrementar os festejos. Com a missão cultural, vieram artistas e também um marcador de quadrilè, que era uma dança da corte francesa. Essa dança cheia de marcações ganhou a simpatia dos serviçais do palácio e saiu dos salões da corte para o quintal e para a senzala, e aquela marcação que ficou na memória é repetida pelo povo e acrescentada a experiências pessoais do tipo “Olha a chuva, olha a cobra”- continua a professora.
O forró, as bandeirinhas e as roupas
Pode não parecer, mas o forró como “música oficial” da festa junina é algo relativamente novo. Assim como outras apropriações culturais, o ritmo entrou para compor a cara da festa em um outro momento histórico, o da chamada cultura de massa. Isso aconteceu basicamente no Nordeste, com uma forma de expandir o turismo. No começo, a festa junina tem uma aceitação muito grande na zona rural por causa da terra, do plantio. Nesses lugares é uma festa devocional, feita em agradecimento aos santos. Quando a festa vem para a cidade, ela perde a religiosidade e vira lucro, uma forma de ter um ganho.
- A cultura é sempre um processo contínuo. A igreja se apropriou das festas anteriores à existência dela. Com a vinda da corte ao Brasil, as comemorações ganharam novos elementos. Tempos depois, a cultura de massa se apropriou e deu uma configuração à festa conforme o seu interesse. É daí que surgem as disputas de maior forró do mundo nas cidades de Campina Grande e Caruaru. Já a bandeirinha é um elemento decorativo que frequenta várias festas populares, como Natal e Copa do Mundo, não é exclusiva desse ciclo. O que restou da festa original é o fogo, a fogueira.
Os trajes típicos – com remendos nas calças, chapéu de palha e dentes pintados de preto - são um capítulo à parte na história das festas juninas e um dos fatores mais representativos da mudança no estilo dos festejos ao longo dos tempos.
- Eu, pessoalmente, atribuo isso ao livro Jeca Tatu, de Monteiro Lobato, que massificou a idéia do caipira, diz a professora Cássia. Esse estereótipo do caipira foi apropriado por um laboratório que tinha, entre os seus remédios, um vermífugo. Para fazer a divulgação desse vermífugo, o laboratório fazia um folheto baseado no personagem de Monteiro Lobato. No livreto, o sujeito está na roça, anêmico, desanimado, e então aparece um médico explicando que os vermes entram pelos pés, por isso as pessoas não devem ficar descalças. Quando o médico volta para examinar o sujeito ele está usando botas e bem melhor de saúde. E, com um detalhe: além dele, todos os bichos estavam calçados – conta Cáscia.
Desse modo, constrói-se a imagem do morador do interior como alguém ingênuo, bobo, e as escolas passam a adotar isso nas festas juninas, com a crianças vestindo botas e calças com uma perna mais curta que a outra, pintando um dente para parecerem desdentadas, usando palha de milho no bolso da camisa. Mais tarde adota-se a blusa xadrez, uma influência do country americano.
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